A CUT FOI UMA GRANDE ESCOLA PARA MIM
Publicado: 02 Dezembro, 2019 - 00h00 | Última modificação: 02 Dezembro, 2019 - 17h18
Quando assumi (na pressão) a presidência da CUT há exatos dez anos, eu sabia que teria que abrir mão da vida pessoal se quisesse manter a central guerreando a altura dos desafios que naquela época já eram grandes, e ainda por cima me preocupava substituir o velho camarada Antonio Góis (urbanitário), dono de uma sagacidade para enxergar a conjuntura e agir sobre ela como poucos no movimento sindical brasileiro.
Aprendi muito com vários companheiros e companheiras, principalmente com Góis e também com Ana Lúcia na convivência sindical e partidária.
Hoje eu e Ana Lúcia estamos militando em tendências diferentes, mas entendo que a verdade é a verdade, e não outra coisa.
Aprendi também com a nova geração de sindicalistas a exemplo de Cristiano Cabral (marxista-Leninista) e Joel Almeida etc. porque não se aprende somente com os mais velhos.
Se cumpri ou não a tarefa adequadamente não cabe a mim julgar, mas cabe dizer que me sacrifiquei muito durante essa década, em respeito aos princípios socialistas e a Central Única dos Trabalhadores.
Antes de chegar na CUT eu já tinha uma pequena experiência, uma vez que ajudei na organização do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias de Sucos e Amido (SINDISA), contribui com o Sindicato das Indústrias Têxteis de Estância (SINDITÊXTIL), esse último com menor participação do que nos outros, havia sido Secretário de Formação Estadual do SINTESE, havia contribuído com a fundação do Sindicato dos Professores da Rede Municipal de Estância (SINTEME), do Sindicato dos Servidores Municipais de Estância (SINDSEME) etc.
Mesmo antes de tudo isso eu já carregava na cacunda uma passagem como dirigente estudantil no curso secundário (década de 70) e fundação do PT, quando ser de esquerda era considerado um crime horrendo.
Sobre o movimento estudantil na época que dirigi juntamente com o atual vereador do PT em Estância (Artur Oliveira), lembro que a sede do grêmio foi fechada pelo delegado de polícia que ameaçou nos prender. Sabem qual foi a nossa reação? Silêncio e medo.
Vivíamos a Ditadura Militar e o presidente era o General João Batista Figueiredo, e na escola que eu estudava era comum delegado de polícia, Tenente do Exercito (TG), promotor e juiz dar aula, e os poucos progressistas não duravam muito como Ruy Figueiredo professor de Educação Artística (hoje mora no Mato Grosso do Sul) e o ex-deputado estadual Leopoldo Souza (MDB).
Sobre a veia de esquerda devo principalmente ao meu irmão, Everaldo Marques de Sousa (Branco), que trazia da UFS livros e jornais que me fizeram conhecer as idéias comunistas, quando eu era só um adolescente. Eu não entendia quase nada, mas ele me explicava, era na base da sabatina, não dava para enrolar. Hoje eu agradeço a ele.
Quando cheguei pra fazer o meu primeiro curso superior encontrei um professor de História (Rui Belém) que lecionava História Econômica. Ele foi a minha segunda influencia importante. Lembro que adotava os livros do grande Caio Prado Junior.
Seria um pecado não reconhecer o grande aprendizado que tive no MST, onde ensinei e aprendi, eu era ao mesmo tempo professor e aluno de formação política nos acampamentos, isso no início do movimento em Sergipe. Agradeço a confiança que tive de João Daniel, Careca, Adinaldo etc.
A partir da sugestão de Ana Lúcia a Articulação de Esquerda defendeu o meu nome para disputar a eleição na CUT caso houvesse mais de uma chapa, mas eu não confirmei com receio do tamanho da responsabilidade, e foi somente durante a Conferência Sindical da Articulação de Esquerda em São Bernardo do Campo (SP) que fui “enquadrado” por ela, Valter Pomar, Hildebrando e Joel Almeida (espero não ter esquecido ninguém).
Faço questão de cravar alguns poucos registros, como o da fundação da Federação dos Servidores Municipais de Sergipe (FETAM), que só foi possível porque o presidente da CUT Antonio Góis priorizou a empreitada e no início eu e Ivonia e viajamos pelo estado para organizar os servidores em sindicatos, num segundo momento eu, Ivonia e Zé Carlos, no terceiro momento eu, Ivonia e Josuel e até o fim eu e Ivonia.
Fundamos mais de cinquenta entidades fazendo formação teórica e também prática, e a CUT introduzindo-os no calendário de lutas de todas as categorias em Aracaju, mas também nos próprios municípios, porque somente os manuais não formam os militantes para a luta de classes.
Se Antonio Gois foi importante, a secretária da CUT, Cleonice Coelho Cardoso (Cléo) foi da mesma forma, porque ela atuou na parte burocrática construindo editais, preparando as eleições, atas, atuou junto ao Ministério do Trabalho no pedido do registro sindical etc. Mas Cléo fez muito mais do que isso, ela orientava os dirigentes neófitos sobre a estrutura e concepção sindical cutista, imprescindíveis para definir a cara do sindicato, e sempre recebeu todos de braços abertos e um sorriso largo, por isso se tornou muito querida pelos municipais.
Ela não é uma burocrata clássica, é uma militante com relevantes serviços prestados a CUT Sergipe e as lutas do povo, pois a partir da central sempre manteve relação com o movimento social, a exemplo do MST, MOTU, Levante Popular da Juventude, Movimentos Identitários, Movimento Estudantil, MTST etc. contribuindo de alguma forma com todas essas entidades.
É impossível não identificar a imagem de Cléo carregando a bandeira da CUT nos registros fotográficos durante as manifestações.
Cléo além de ter história própria, tem em casa referencia de luta em seu Esposo, o companheiro JR, ex-dirigente do Sindicato dos Químicos (SINDQUÍMICA) que depois fundiu-se com o SINDPETRO, e dirigente da CUT por um longo período.
A última vez que vi JR em ação como dirigente sindical foi em um congresso da CUT no auditório da reitoria da UFS, na época eu o achava muito radical, porém, coerente na defesa do que acreditava.
Antes de se aposentar pela Petrobras o velho combatente disputou a eleição do SINDPETRO como candidato a presidente, mas apesar do bom desempenho perdeu.
Cleonice Coelho tem formação acadêmica em administração, e isso explica como ela faz funcionar uma entidade gigante com parcos recursos e não comprometer a luta.
Quando falta dinheiro para manter a estrutura das manifestações ela passa a sacola nos sindicatos com menos dificuldades financeiras, e é assim que a coisa acontece. A CUT deve muito a Cléo, e o meu mandato que se encerrou no último domingo principalmente.
Eu seria ingênuo (ou prepotente) se achasse que fiz um mandato que não deixou margem para as críticas, mas confesso que me dediquei ao máximo para fazer o melhor, abdicando da vida pessoal (já citado anteriormente) e comprometendo a vida profissional, porque deixei de lado o sonho de ser professor na academia, isso porque só consegui chegar a pós-graduação, quando precisava de um doutorado ou no mínimo de um mestrado, mas agora já é tarde porque estou chegando aos sessenta anos de idade e me aposentado como professor da educação básica.
O que mais doeu em mim nesse período não foi o sol causticante durante as passeatas, os calos nos pés das longas jornadas, a possibilidade de tomar um tiro da polícia nos piquetes durante as greves, o estômago remoendo quando viajava e não levava dinheiro para comer, o cansaço pela agenda intensa, os processos judiciais, os BOs etc. Nada disso doeu mais do que as criticas mordazes (em minha opinião injustas), as tentativas de me enquadrar como incompetente, autoritário, a galhofa velada, o boicote etc.
Lembro-me que viajando com as minhas filhas de Aracaju para Estância eu disse que se um dia eu fosse preso, não sentissem vergonha, porque não estaria sendo preso como bandido, mas por estar defendendo a classe trabalhadora.
Mas no dia da despedida da presidência as cicatrizes foram fechadas pelo carinho e o reconhecimento pelo meu esforço e lealdade, vindo da maioria absoluta dos delegados (e não da totalidade) do CONCUT, porque não sou e nem nunca tive a pretensão de ser unanimidade.
A CUT vive em constantes disputas internas provocadas pelas correntes, porque lá é diferente de uma irmandade de igreja e de um partido monolítico, lá é literalmente plural, e teses e antítese estão em choque permanente.
Nos momentos de crise aguda eu ouvia sempre o companheiro Cristiano Cabral (servidor da justiça federal em Salvador), que dizia: “calma, paz entre nós, guerra aos senhores”.
Quem me conhece sabe que sou duro na defesa do que acredito, mas não sou desleal, não sou vaidoso e isso tá faltando em muita gente.
Eu havia decidido deixar a CUT e contribuir com a luta não mais como dirigente, o meu projeto era pesquisar e escrever textos e livros para servir de formação política, porque nunca tive apego ao aparelho tanto é que durante muito tempo fiquei fora da direção do SINTESE por opção.
No caso da CUT me rendi as ponderações principalmente Ivonete Cruz, presidenta do SINTESE (eleita para direção nacional da CUT), do negão Joel Almeida e Roberto Silva, e resolvi ficar na Secretaria de Formação. Dizer não a quem tanto me ajudou foi impossível.
A corrente Articulação de Esquerda tem o privilégio de contar com a orientação política de dois quadros intelectuais internacionais. Estou me referindo a Valter Pomar e Jandira Wehara.
Assumem a presidência e vice Roberto Silva e Ivonia Aparecida, e assim a CUT seguira a sua jornada de lutas rumo ao socialismo, porque tem um conjunto de militantes na direção altamente qualificado.
Um forte abraço !!!