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OPINIÃO: Centenário do Sociólogo Florestan Fernandes

Publicado: 30 Julho, 2020 - 11h46 | Última modificação: 30 Julho, 2020 - 12h14

Escrito por: Rubens Marques - Secretário de Formação Sindical da CUT/SE

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A ELAHP - Escola Latino-Americana de História e Política está promovendo um ciclo de debates, e na terça o tema foi o centenário de Florestan Fernandes (na quarta foi sobre Celso Furtado).

A história desse sociólogo genial denuncia a exclusão social nesse "brasil" que impõe um funil cada vez mais apertado para que a massa espoliada continue servindo de degrau para a classe opressora.

A inteligência não escolhe classe social nem cor da pele ou etnia, o problema está nas oportunidades negadas historicamente à massa explorada.

Florestan Fernandes, um dos sociólogos mais respeitados não só no Brasil, por pouco não parou de estudar para continuar fazendo bicos para ajudar a sua mãe, moradora de um cortiço em São Paulo.

Milhões de pessoas inteligentes como Florestan não passaram das primeiras letras e tantos outros sequer aprenderam a ler e a escrever.

Ele já fez de tudo para ajudar a mãe: varreu salão de barbeiro, deu recados, foi engraxate, garçom etc. Tudo isso antes de completar 10 anos de idade, exceto a atividade de garçom. O moleque chegou a passar fome.

Como não podia parar de trabalhar, abandou o curso primário e só voltou depois, influenciado por amigos, então ele fez a antiga modalidade "Madureza" (hoje, supletivo).

Desde criança Florestan Fernandes se interessava pelos livros que tinha acesso na casa da madrinha.

Sem condições de criá-lo, a sua mãe (doméstica) foi aconselhada a "dar" o garoto Florestan  para uma família que pudesse mantê-lo e colocá-lo para estudar. A resposta dela foi: "filho a gente não dá, cachorro sim". E não deu.

O fato é que ele passou no funil apertado e se aposentou como professor da USP - Universidade de São Paulo, de onde foi temporariamente afastado pela Ditadura Militar, e por isso viveu no exílio até ser convidado pelo Arcebispo de São Paulo, D. Paulo Evaristo Arns para ensinar na na PUC - Pontificia Universidade Católica.

O governo militar fez pressão para D. Paulo não admitir o sociólogo, mas ele enfrentou os milicos e o manteve na PUC.

Com uma produção intelectual infinitamente maior e mais respeitada do que a do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso - que não passou de um ensaio, "Teoria da Dependência," o centenário desse grande mestre não foi lembrado pelos meios de comunicação.

A convite de Lula, o professor Florestan foi candidato a deputado federal e se elegeu por dois mandatos, e com a saúde debilitada abandonou as disputas eleitorais, mas nunca deixou de ser militante.

Não faz muito tempo, eu escrevi um pequeno texto sobre Florestan Fernandes, e citei uma passagem que marcou, e foi narrada pelo seu filho, Florestan Fernandes Junior (jornalista). Veja o relato abaixo:

"Uma das passagens mais interessantes da vida do sociólogo foi relatada na audiência pelo assessor parlamentar Laurez Cerqueira, que trabalhou com Florestan durante seu mandato de deputado (1987-1994). Quase ao fim da vida, já debilitado devido à hepatite C que contraiu em uma transfusão de sangue, o sociólogo (1920-1995) teve uma crise e foi, sozinho, a um hospital público para ser atendido. Logo depois, seu filho, o jornalista Florestan Fernandes Jr., o encontrou no hospital, de robe, aguardando o atendimento. Como o pai se recusava a sair da fila em que estava, o filho teve de pedir a ajuda de um médico para convencê-lo a ser atendido imediatamente.

Laurez, autor do livro Florestan Fernandes - Vida e Obra, também contou que, numa fase seguinte, em estado ainda mais grave, o sociólogo recebeu do médico orientação para fazer um transplante de fígado. Quando tomou conhecimento do fato, o então presidente, e sociólogo, Fernando Henrique Cardoso ligou para o colega de academia, colocando à sua disposição tudo o que fosse necessário, inclusive a possibilidade de realizar a operação em Cleveland (EUA). Florestan recusou a ajuda, argumentando que havia muitas outras pessoas antes dele esperando pela operação. "Só aceito se a oferta for feita a todos", teria dito o ex-deputado. Acabou fazendo a cirurgia no Brasil". Fonte: Agência Senado.

O Sistema de Cotas implantado no governo Lula pode fazer emergir milhares de "Florestans".