Escrito por: Iracema Corso

Pescadoras denunciam contaminação do São Francisco por agrotóxicos

CUT/SE visitou o povoado do Serrão em Ilha das Flores para ouvir a denúncia de pescadoras sobre a qualidade da água na margem Sergipe do Rio São Francisco e os impactos na saúde da população ribeirinha

No povoado Serrão, em Ilha das Flores, margem Sergipe do Rio São Francisco, as pescadoras e pescadores na região da Engazeira reclamam da poluição do rio pelo despejo de água contaminada de agrotóxicos utilizados pela rizicultura (plantação de arroz).

A denúncia é da Associação de Mulheres e Homens Pescadores Nossa Senhora Aparecida Povoado Serrão Ilha das Flores, filiada à Central Única dos Trabalhadores (CUT/SE). Segundo a presidenta da Associação ,Zilda Souza, a região da Engazeira, no povoado do Serrão, é onde o problema da poluição das águas do Rio São Francisco é mais grave.

Zilda cita o exemplo do riacho Bong que perpassa o município Ilha das Flores e leva água limpa para a agricultura e principalmente para a rizicultura da região. No entanto, após a água doce e limpa ser captada e usada pela rizicultura, ela é devolvida suja para o riacho que desagua no Rio São Francisco, principal bacia hidrográfica da região Nordeste.

Zilda relatou que o despejo de água contaminada no rio prejudica o meio ambiente, os peixes, compromete a saúde das famílias de pescadoras, pescadores e marisqueiras que estão sempre em contato com esta água e por isso acabam adoecendo.

"A destruição da natureza acaba inviabilizando a pesca. Nos períodos de muita chuva, os peixes se escondem no fundo do rio, e fica mais difícil pescar. No verão, com o sol forte, a água poluída da rizicultura forma uma espuma tão fedorenta, uma espuma tão grossa que dá pra cortar com uma faca. É um crime o que estão fazendo com o Rio São Francisco", relatou Zilda.

Melhorias
Por meio do Projeto Dom Távora em parceria com o Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola (Fida), a Associação conquistou a aquisição de 14 embarcações que atendem a 50 famílias de pescadoras e pescadores da região.

“Antes a gente pegava carona de barco para ir pescar no outro lado do rio. Aqui é muito difícil por que é muito fundo, lá do outro lado, é mais fácil de pegar o peixe, o camarão, na de Ilha de Seu Noca que tem poças e a gente tem uma profundidade melhor para pescar. Então, com o projeto que conseguimos e com as embarcações, ficou muito melhor", explicou Zilda Souza.

A pescadora contou que no povoado do Serrão nem todo mundo tem água encanada, por isso a água do rio é usada para tudo em muitas casas. Assim, as embarcações conquistadas também servem para os pescadores pegarem água no meio do rio, pois não apresenta o mau cheiro e a cor escura da água que fica nas margens.

Problemas de saúde
A pescadora Zilda relata que crianças, adultos e idosos da comunidade têm problemas de saúde. "Tive pessoas da associação com 35 anos e que tiveram câncer e morreram. Foi um sentimento pra gente perder uma companheira querida para o câncer. Além do luto, a situação aumenta a nossa preocupação sobre a contaminação da água".

A presidenta da Associação fez um apelo para que as autoridades competentes resolvam este problema que interfere na vida de toda a comunidade ribeirinha.

"A gente não sabe se é por causa do contato com essa água (que a gente vê que está contaminada por causa do cheiro ruim e da espuma marrom), que as pessoas estão com tumor e câncer, mas a gente sabe que o agrotóxico é prejudicial à saúde e dá câncer sim. O que é constante e a gente vê por aqui é a coceira na pele que causa feridas; é mulher com problema no útero; é câncer de mama… Somos uma associação formada por mulheres em sua maioria, tudo isso nos preocupa. Agora imagine uma criança se banhando e tomando dessa água todo dia, com o passar do tempo como é que a saúde dessa criança vai ficar? Não é todo mundo que tem dinheiro para comprar um galão de água, então quem precisa usa água do rio mesmo”, questionou Zilda.

Elisangela Santos, pescadora que vive na região da Engazeira, explicou que a população ribeirinha toda é prejudicada com a poluição da água. “É o mau cheiro, lesões na pele devido às coceiras. Eu uso a água para lavar a louça e para o almoço. Não uso para beber. Mas o pescador fica o tempo todo em contato com a água. Sabemos que o nome do veneno é Roundup. Colocam para matar o mato e as lagartas. Não estamos dizendo que não é para plantar, mas devia haver um tratamento dessa água antes de despejar de volta no rio para essas crianças não ficarem com diarréia, com coceira”, declarou a pescadora e mãe de família.

Pescador de longa data que prefere não revelar a idade, seu Castelo que mora com a família  na região da Engazeira, fala de dificuldades que a comunidade de pescadores enfrenta e apoia dona Zilda na luta por projetos de incentivo à pesca. A manutenção dos barcos e redes, a aquisição de embarcações para que a famílias possam buscar o peixe são assuntos importantes, mas a principal temática é a água do Rio São Francisco.

"A qualidade da água é o pior problema. A gente tomava a água do brejo. E com o veneno que é jogado aí no rio a água fica contaminada. A maior dificuldade que a gente está tendo é com essa água. O pessoal tem coceira, diarreia, vômito, muitas doenças, inclusive muito câncer. Antes a gente tomava água do rio e não tinha problema. Mas agora está totalmente contaminada com os esgotos que vêm do arroz", afirmou o pescador Castelo.

A CUT Sergipe apoia a luta da Associação de Mulheres e Homens Pescadores Nossa Senhora Aparecida Povoado Serrão Ilha das Flores para solucionar o problema de contaminação da água, bem essencial para a vida de toda a comunidade ribeirinha do Baixo São Francisco.